quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Artur Wilks e Tomás Simpson

Dispus-me hoje a evocar rostos estimados e mãos acolhedoras de dois homens, pregadores do Evangelho em simplicidade afectiva e ânsia de expansão, mantenedores sucessivos do ministério da Palavra numa congregação metodista em Lisboa, onde a obra realizada teve uma aura que alguns, aliás poucos, dos vivos, poderão atestar. Aqui o documento histórico é o testemunho de coevos, como são o Rev.º Josué de Sousa, João Coelho, Ruben Pestana, segundo creio.

Esses dois ministros com os quais a Sociedade Metodista respondia a intantes [sic] pedidos, foram Artur Wilks e Tomás Simpson.

Artur Wilks

O Rev.º Artur H. Wilks foi o primeiro ministro da “Igreja da Estefânia”, instituído em 1901 pelo Superintendente residente no Porto Rev.º Roberto Hawkey Moreton. Era um homem na força da vida quando chegou. De estatura meã, louro e alegre, possuindo em grau elevado o dom da simpatia e uma certa facilidade linguística, foi um activo organizador, amando a obra que lhe era entregue.

A ele deveu um rapazito de dezasseis anos a oferta duma “Concordância Bíblica” de Cruden e o encargo de dirigir uma classe da Escola Dominical, assim como o convite (que coragem!) para ele subir ao modesto estrado daquela cave que Deus tanto abençoou, com grandes auditórios e até com o susto de certos adversários, educados numa escola que felizmente se considera talvez definitivamente extinta.

Fora um açoreano, Júlio Francisco da Silva Oliveira, que no Brasil o Santo Evangelho conquistara, e se filiara na Igreja Presbiteriana, no Rio de Janeiro, quem, domiciliado no Bairro da Estefânia, em Lisboa, fundou uma Escola Dominical em sua casa, início da missão depois estabelecida na Rua Angra do Heroísmo. Não pudera a sua Igreja, no Brasil, corresponder ao pedido que ele fizera, de até ali o estender a sua actividade evangélica, apesar da boa cooperação material que o fundador lhe dera, e foi justamente a Igreja Metodista que aceitou o generoso repto. Foram frequentes as visitas a Lisboa dos Rev.º R. Moreton e Alfredo Silva, repartindo eles então os seus serviços, ecumenicamente, pela nova Missão e a velha Igreja Presbiteriana Portuguesa, acomodada no salão inferior do templo escocês, na rua da Arriaga.

Muito devemos, todos nós, uns aos outros!

Frequentes eram os ataques de certa Imprensa e de certos púlpitos, estes por sinal ocupados por prosadores castiços como o P. Sena Freitas e oradores fecundos como Mons. Alçada de Paiva.

Curta foi a acção de Wilks, que, depois de uma crise que mereceria ser descrita em “novela corta”, na Primavera de 1903 declarou-se-lhe uma enfermidade de origem psíquica que o inutilizou por muito tempo e o impediu de regressar ao pais onde fora acolhido com alegria e cuja língua conseguira dominar, o que o tornaria tão útil entre nós.

Tomás Simpson

Em Setembro desse mesmo ano iniciava no Porto o Rev.º Tomás Artur Simpson a aprendizagem do português, em cujo o uso aliás sempre se sentiu fraco, ele que, noutra linguagem, a música, se sentiu tão à vontade, como organista hábil e na composição de alguns hinos com particular beleza.

A uma letra do autor destas singelas linhas intitulada “Cantemos a Cristo”, canção destinada às crianças, deu uma interpretação melódica adequada; mas superior exemplo da sua arte é essa bela partitura para a inspirada poesia de D. Elvira de Andrade Melo e Silva “Aleluia, eis o farol…”

Tomás Simpson foi apresentado à Igreja Metodista de Lisboa a 11 de Agosto de 1904, e durante três anos deu ao pequeno rebanho nutriente pasto, em sermões de textura clássica e sólido fundo teológico, para o que revelou particular competência.

“Recordar é viver”, é costume dizer-se; e a Igreja, para viver, necessita de recordar o que o Espírito de Deus tem feito por meio dos membros dela, em gerações sucessivas. Lembremo-nos de que os profetas tinham a função, não só de prever como de recordar, ligando sàbiamente o passado ao futuro.

A Igreja Lisbonense, hoje Presbiteriana, que ainda há pouco celebrou com grande sentido de dignidade e de afectividade, o centenário do nascimento do saudoso pastor José Augusto Santos e Silva, o primeiro que teve desde a sua adopção do regime congregacional, é a herdeira directa da primeira actividade local, não só missionária como eclesiástica, feita num magnífico espírito de cooperação de diferentes confissões mas de idêntica finalidade cristã.

Eduardo Moreira,
Rostos que vi, mãos que apertei,
Portugal Evangélico, Janeiro-Março de 1964, nº319-321, pp. 9-10.
 
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